segunda-feira, junho 21, 2004

AMANHECE...


Tem gente que nunca viu o dia amanhecer. Ou faz disso um ritual que é cumprido em algum dia do ano, de preferência no primeiro. Em geral está tão bêbado que não vê realmente o dia amanhecer, mas pressente, pela ressaca das três horas da tarde, que alguma coisa diferente aconteceu. Eu vejo o dia amanhecer quase todos os dias. Estou vendo agora. É verdade que tenho que tirar os olhos do teclado e virar um pouco o rosto para a janela, coisa um pouco difícil, porque eu não sei exatamente onde estão as teclas.Nunca decorei. Mas o dia amanhece como uma fotografia em fade. A luz se faz devagarinho, como se uma mão invisível fosse esparramando um pozinho violeta que entra pelas gretas, fura as cortinas, e colore de lilás as paredes brancas. É bonito e tem um cheiro de coisa nova, cheiro de bebê. Ou cheiro de café novo, quentinho, aconchegante. Um novo dia, o mais novo de todos, o único ainda não vivido, o primeiro, o diferente de todos os outros, como uma impressão digital. Único. Daqui a pouco tudo voltará a ser velho.

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