sábado, maio 13, 2006

À MINHA MÃE...

Você me amou mais do que pensei alguém pudesse amar. E era tão normal que assim fosse!
Tão natural, mãe, como a cor dos seus olhos ou seu jeito de rir devagarinho, seus passinhos miúdos, seu jeito quase infantil de brincar comigo, quando eu ainda pensava que já era adulta. Aqui, deste lado, a vida sem você pesa. Às vezes, uma voz qualquer tem o tom da sua e eu me espanto esperando ver você chegar, como antes, e ficar silenciosa ao meu lado. Quantas vezes o seu silêncio me irritou e calada fiquei, ostensiva, para que você percebesse que eu estava muito longe das suas pequenas preocupações, que não tinha tempo para você. E você saia, silenciosa, para não me interromper. Aliviada, nunca pensei o que você fez depois. Um dia qualquer eu me lembrava do seu silêncio e ia a sua procura. Era natural que você parasse tudo, desligasse a televisão, colocasse a mesa e me servisse o café quentinho, passado na hora. Era natural que me ouvisse, risse comigo e tantas vezes me consolasse da vida.

Esse, mãe, era o meu tempo, o tempo que me sobrava, o tempo que não fazia falta, a migalha, o pedaço que não servia para nada e que eu dava para você. E você o enfeitava com fitas cor de rosa, toalhas de crochê, cheiro de café e o seu olhar, inteiro, para mim. E me devolvia o que lhe dava com desdém, num precioso e perfumado momento de ternura. Eu saia da sua presença sem saber que levava comigo de volta, costurado e perfumado, o tempo que me sobrava. Eu aplacava minha consciência. Você, naturalmente, me amava.

O que me dói, mãe, é a certeza de que não tenho mais tempo. Que você está tão desmesuradamente longe de mim que nem o seu silêncio me atinge; que seu olhar cansado já olha em outra direção e só hoje, tão tarde, percebo que o único tempo importante na minha vida foi exatamente o que não lhe dei.
.....................
Ilustração:Adrian Martinez

2 comentários:

Anônimo disse...

Teruska, fique certa de que ela entendeu e te amou da mesma forma.
Pode ficar certa...
Um beijo grande

Anônimo disse...

Teruska,textos como esse são fantásticos.Incrível a sua sensibilidade para transformar sentimentos em palavras, um jeito
muito bom de contar suas memórias.
Não desperdice o seu talento.
tereza.